Paul PONTALLIER no Château Margaux

Château Margaux mantém, como nenhuma outra propriedade no mundo, o culto à elegância e ao refinamento, e Paul PONTALLIER é o Diretor Geral e o embaixador deste refinamento e deste encanto. Personagem conhecido mundialmente, mesmo por quem não se interessa muito por vinho, Paul é extremamente simples e ama compartilhar sua paixão pelos vinhos do Château Margaux.

O encantamento começa quando, ao sair da estrada principal (D2) e seguir o caminho retilíneo ao lado do cemitério do vilarejo de Margaux, descobrimos a esplêndida avenida que conduz ao Château. Ao final da avenida, se encontra a imagem que todo mundo já viu ao menos uma vez na vida – o Château Margaux – um lindo palácio, com suas grandes escadarias e 4 colunas jônicas sustentando um pórtico de estilo neo-palladiano, tudo emoldurado pelos plátanos centenários que bordam a entrada.

A história daquela propriedade é bem mais antiga que seu próprio Château do século XIX. Ela começa a ser contada no século XII, quando a propriedade se chamava ‘La Mothe de Margaux’, mas ainda não existiam vinhas. Várias familias da nobreza se sucederam, mas foi ao final do século XVI, com Pierre DE LESTONNAC, que se abandonou o cultivo de cereais em favor das uvas. Um século depois, Château Margaux já ocupava seus 262 hectares, área mantida até os dias de hoje, das quais apenas 1/3 plantados de vinhas.

68 anos antes da classificação dos Grand Crus de 1855, o então ministro-embaixador americano Thomas JEFFERSON (depois presidente dos Estados Unidos 1801-1809) já havia feito sua classificação dos melhores vinhos de Bordeaux.  Em sua hierarquia, JEFFERSON coloca o Château Margaux  na primeira posição, e em suas memórias escreveu: “there cannot be a better bottle of Bordeaux” (não há melhor garrafa de Bordeaux). A Classificação de 1855, encomendada por Napoleão III (presidente eleito e em seguida Imperador, através de um golpe de estado) confirmou o Château Margaux no topo dos 4 melhores vinhos do Médoc. Mais recetemente, este Premier Grand Cru Classé ganhou os favores de outro presidente; Hu Jintao escolheu a propriedade para ser a única vinícola visitada durante a passagem do presidente Chinês pela França, em 2001.

Mas, por que este vinho encanta presidentes e celebridades há mais de dois séculos? Para responder esta, e outras questões sobre o Château Margaux, o elegante Paul PONTALLIER, recebeu RENDEZVOUS no Château, desta vez como um vigneron, um homem do vinho, sem gravata e de mangas arregaçadas, que queria passar o resto dia explicando sua visão e seu amor por Margaux.

Paul começa nos contando sobre como se tornou quem é hoje: “Minha carreira foi relativamente simples”, define em uma frase, e relembra seu percurso: “Eu nasci em Bordeaux, em uma família que produz vinho há 700 anos, em Sauternes, mas nossa propriedade não é muito conhecida. A família de meu avô tem uma propriedade, não muito grande, mas que faz um vinho muito bom, chamado Château Raymond-Lafon. Este é um vinho relativamente reconhecido, mas outros membros da minha família fazem vinhos muito mais modestos: Bordeaux, Bordeaux-superior, coisas desse tipo. E eu sempre estive no mundo do vinho; é meu meio familiar e cultural – o que não necessariamente me predispunha, nem a fazer os estudos que eu fiz, nem a exercer o métier que exerço. Mas quando olhamos para o passado, com um pouco de recuo, percebemos que nada é por acaso”.

“O fato é que, quando eu era jovem, eu não queria fazer parte deste métier. Até mesmo meu pai, quando se viu à frente daquela propriedade familiar, por força das circunstâncias, desaconselhou fortemente meu irmão e a mim de participar deste ‘ramo’. Diante disso, meu irmão virou médico, apesar de ser responsável por uma parte de nossas propriedades familiares, e eu, bom… eu não segui na direção de fazer o que eu faço, mas acabei me tornando o que sou”.

Tendo em suas mãos os diplomas de engenheiro agrônomo e doutor em enologia, mas desencorajado por seu pai a seguir uma carreira no vinho, Paul resolveu lecionar. “Na verdade, eu parti para a América Latina e morei no Chile durante dois anos. Na época a França tinha uma grande quantidade de jovens, que partiam para o serviço militar; jovens que tinham bons níveis de estudo, e que tinham a opção de prestar o serviço militar ou técnico – e é claro que eu preferia mil vezes fazer um serviço voluntário técnico!” [risos]

“Eu fui o primeiro ‘cooperante’ (este era o nome: cooperante francês) a ir para o Chile depois dos eventos políticos de ALLENDE e PINOCHET. Eu fui para ser professor na Universidade Católica de Santiago e ministrei o curso de enologia em 81 e 82. Fiquei quase dois anos e viajei toda a América Latina; visitei os vinhedos brasileiros, pros lados de Garibaldi, e pude conhecer muita gente simpática. Somente retornei ao Brasil algum tempo depois, mas aí já foi para representar o Château Margaux”.

Paul PONTALLIER chegou ao Château Margaux em 1983 e, sem saber, exatamente quando se iniciava um ciclo virtuoso para o vinho Francês. Seis anos antes, a propriedade havia sido alvo de enorme polêmica: um grego, dono de uma rede de pequenos supermercados, acabava de comprar o místico Château Margaux. O mundo do vinho estava chocado, porém, André MENTZELOPOULOS, impulsionado pela boa fase, trouxe novamente prestígio ao Grand Cru, e Paul foi o personagem central desta revolução.

“Quando voltei para a França, no início de 1983, eu estava procurando uma colocação e já tinha contatado o Château Margaux que, na época, estava procurando alguém para suceder seu diretor [Philippe BARRÉ]. Então, desde primavera de 1983, eu assumi esse trabalho: há exatos 29 anos”.

“Houve um período em que trabalhamos juntos (Philippe BARRÉ e eu). Ele poderia ter se aposentado antes, mas estava em grande forma e aceitou ficar três anos a mais (na verdade acabou ficando cinco anos – até 1989). Nós nos entendíamos muito bem (ele era uma pessoa de uma grande sabedoria) e eu fiquei muito contente por ele poder ficar mais tempo. Eu aprendi muito com a experiência dele”.

Vigneron ou Embaixador?

 O ‘rosto’ do Château Margaux, se considera, acima de tudo, um vigneron, e diz que sua primeira responsabilidade é a de fazer o vinho, o melhor vinho possível, e que todo o resto é acessório:

“Antes de tudo, eu sou um homem do vinho e da vinha; é minha cultura primária e eu penso que é a minha responsabilidade principal. Meu primeiro dever é de criar as circunstâncias, de formar uma equipe (porque claro que eu não posso fazer nada sozinho), e fazer com que todos os anos nós possamos alcançar um nível de qualidade que revele, e até mesmo sublime, a personalidade do terroir. Esta é minha primeira responsabilidade. Claro que tenho responsabilidades secundárias (que hoje têm mais importância do que no passado), como ser o embaixador do Château Margaux. Hoje em dia, MUITO mais do que há vinte ou trinta anos, é necessário saber falar deste vinho tão único, e a maior parte das pessoas no mundo espera que seja um ‘homem do vinho’ a falar sobre ele”.

“Acho que se trata do que os americanos chamam (de uma maneira imprópria) the winemaker – que é uma palavra que realmente não me convém, e que, aliás, nem existe em francês”. Paul se refere à filosofia de que o homem não produz um grande vinho; um grande vinho é produto de seu terroir e o homem apenas conduz a transformação do mosto da uva ao que ele já estava predestinado a ser, ou seja, um grande vinho.

“Cada vez mais as pessoas esperam que o vinho seja ‘contado’ e ‘explicado’ por ‘pessoas do vinho’. Desta forma, muito mais do que há 30 anos, este papel de embaixador toma bastante do meu tempo. Eu diria que 50% de meu tempo, hoje, é ocupado por esta função. No entanto, apesar de ser uma função grandiosa, acredito que minha principal responsabilidade é produzir o vinho de Margaux; isto é o mais importante”.

Outra responsabilidade é a de gerir a empresa: “Château Margaux é uma empresa que faz apenas vinho (não faz nada além disso). Acontece que, para produzir vinho, são necessários prédios, equipes e decisões (que nem sempre estão relacionadas diretamente ao vinho)”.

E qual a opinião de Paul a respeito do que faz de Château Margaux, um vinho tão especial? Como ele o define? “Essa é uma pergunta que me faço constantemente. Estou sempre me perguntando e me forçando a refletir sobre o que faz do Château Margaux este vinho particular, único. Isso não é óbvio; não existe uma só resposta. Eu acho que antes de qualquer coisa, Château Margaux é um grande terroir (o que não é muito original, porque todo grande vinho é feito a partir de um grande terroir). Mas existem, no Château Margaux, algumas parcelas (as quais eu conheço bem) que são verdadeiramente EXTRAORDINÁRIAS, e que fazem a alma do vinho desta propriedade. Além deste Grande terroir, existe ainda uma história muito antiga, não somente de cultivar a vinha e de produzir vinho, mas principalmente da busca pela excelência”.

“Há séculos se produz vinho por toda parte na Europa – antes mesmo da Idade média – porém não existem muitos lugares onde, desde cedo, se buscou a excelência. E no Château Margaux (como em outros Premiers Grand Crus de Bordeaux), nós temos esta longa história (que tem provavelmente mais de 400/500 anos), de buscar a todo custo fazer um Grande vinho”.

“Eu diria que Château Margaux é o resultado da combinação de dois fatores. O primeiro [fator], que eu chamaria de ‘genético’, corresponde ao seu grande terroir. O segundo, que é ‘cultural’, está presente nas muitas gerações que se sucederam, e em suas buscas incessantes por elaborar um vinho de excelência, buscando sempre as melhores partes do terroir. Estas pessoas, desde o início, entenderam que para fazer um ‘Grande vinho’, era necessário refletir, de forma fidedigna, a genialidade do terroir de Margaux – extrair a quinta essência deste Grande terroir”.

“Um Grande vinho resulta do casamento do terroir com o trabalho humano, e não podemos imaginar um sem o outro. Há casos de Grandes terroirs que jamais puderam se beneficiar desta busca pela excelência (ou seja, do trabalho humano), e nunca produziram Grandes vinhos. Sem o trabalho humano não há vinho. Uma simples comparação seria: Um grande vinho resulta dos mesmos fatores de sucesso que conduzem um indivíduo a se tornar um Grande homem. É necessária uma boa genética, incontestavelmente, mas que resulta em muito pouco sem a intervenção de um ambiente cultural, de educação, e de vários outros fatores que são indispensáveis. Então, ambos os fatores (que chamamos de fatores inerentes e fatores adquiridos), devem se ‘casar’, se influenciar a partir de regras bastante complexas”.

“Um Grande vinho é exatamente assim! É o encontro de um grande terroir (que seria o fator inerente), com o ambiente humano, ou seja, o trabalho mais adaptado a esse terroir (fator adquirido). É como adaptar a educação à personalidade de uma criança. Nós sabemos – não sei se vocês têm filhos, mas eu tenho quatro – que não podemos tomar as mesmas decisões, agir da mesma maneira, de forma igual, com todos os filhos; não existem regras para isso, mas é necessário adaptar cada situação a cada filho. É a mesma coisa com o vinho”.

Colocando seu trabalho em perspectiva, Paul contextualiza o conceito: “O que fundamentalmente faz de Château Margaux um vinho diferente dos outros é o seu terroir, e eu penso que a atitude das pessoas do vinho, ao menos a minha atitude, consiste em tentar revelar, da melhor forma possível e o mais fielmente possível, a genialidade deste terroir. Eu me permito, novamente, realizar a comparação com a educação de uma criança: O que buscamos criando nossos filhos? Não deve ser uma resposta aos nossos próprios sonhos, mas sim de fazer o possível para revelar a genialidade ou, ao menos o melhor, da personalidade de cada filho. E de lhe permitir ter seus próprios sonhos e vivê-los. Então existe, entre as pessoas do vinho, necessariamente, uma grande humildade, como os pais devem ter. O objetivo nunca deve ser de produzir um vinho exprimindo suas próprias ideias ou seus próprios sonhos. É claro que isto irá acontecer nos vinhedos que não possuem um grande terroir, pois quando decidimos produzir vinho em locais em que o terroir não carrega qualquer genialidade, é importante que tenhamos nossas próprias ideias e expressões. Porém, em um terroir como Château Margaux, eu acho que o mais importante é compreender e admitir que o ‘gênio do terroir’ é quem deve falar”.

Paul PONTALLIER é de uma humildade impressionante e faz questão, sempre que possível, de se apagar face ao seu vinho: “Depois de quase trinta anos que eu passei em Margaux (o que representa mais da metade da minha vida), eu acho (e desejo), que encontremos mais de Château Margaux em mim do que de mim em Château Margaux. Quando você se confronta com uma personalidade verdadeiramente carismática (que é o caso de uma propriedade como Château Margaux), você se deixa influenciar (quase se dominar) por esta personalidade. O que eu tento é manter a humildade para reconhecer o que é realmente fundamental: primeiro a personalidade do terroir e, em segundo, muito trabalho para que este terroir se exprima. Bom, estou certo de que eu fui muito mais influenciado por Château Margaux que o inverso”.

Com relação a sua marca pessoal, que fez com que o Château Margaux retornasse ao topo dos melhores vinhos do mundo, Paul acredita que teve apenas sorte: “Penso que Château Margaux sempre teve sua genialidade, mas que se exprimia ora com maior ora com menor exatidão e refinamento; era inconstante demais. Eu tive muita sorte porque cheguei à propriedade em uma época em que era tudo muito mais difícil, quer fosse pelos hábitos, pelas condições financeiras, pelos processos. E a partir de então é que foi ficando cada vez menos complicado. Hoje em dia nós podemos nos permitir mergulhar profundamente em cada detalhe, praticar seleções que nem mesmo sonhávamos vinte anos atrás”.

Paul explica quais os recursos e técnicas que se permite utilizar no Château Margaux: “No plano técnico, permito tudo (apesar de muita coisa não ser necessariamente eficaz, ou mesmo útil)”. E exemplifica: “Nos grandes Crus, e no Château Margaux em particular, nós fazemos ‘segundos vinhos’ há muito tempo. No século XIX se chamava Château Margaux Deuxieme Vin e no começo do século XX (entre 1907 e 1908), passou a se chamar Pavillon Rouge du Château Margaux. Em todo caso, quando eu cheguei aqui em 1983, o primeiro vinho representava dois terços da colheita e o segundo vinho representava o último terço. Na época, tínhamos a impressão (e todo mundo nos dizia) que um terço era uma quantidade ENORME para um segundo vinho; as pessoas não entendiam porque fazíamos um terço deste segundo vinho. Hoje em dia uma safra de um grande ano se divide em um terço de primeiro vinho, um terço de segundo vinho, e o último terço repartidos entre terceiro e quarto vinhos!”

“O terceiro vinho existe há quase 20 anos e não havia sido engarrafado até os últimos anos (nós os vendíamos ‘em volume’ [vrac em francês], e foi a partir do millésime de 2009, que decidimos engarrafá-lo). A decisão foi baseada no fato de que a qualidade justificava que esse vinho fosse engarrafado. Logicamente que, a partir de então, com o terceiro vinho engarrafado, nós sentimos a obrigação de praticar uma seleção que permitisse separar, deste bom vinho, o que seria vendido em vrac, ou seja, o quarto vinho. Mas esse nosso terceiro vinho ainda não foi comercializado e, por isso, ainda não comunicamos o novo rótulo”.

“Perceba que já temos, com isso, um novo patamar de qualidade. Como reduzimos a produção do primeiro vinho de dois terços da colheita para um terço, a seleção para este vinho se tornou ainda mais rigorosa, e quando você faz uma selação mais rigorosa, você aumenta o nível de qualidade”.

“Nós podemos tomar outros exemplos também. Nos últimos 30 anos, pudemos evoluir a um nível de operação de muito mais precisão, e de uma qualidade de trabalho incrível, a qual eu nem ousaria pensar quando cheguei aqui. Château Margaux se beneficiou, assim como outros Crus, deste ambiente que se tornou extremamente favorável em relação ao que existia há 30/35 anos”.

O inflacionado mercado de Grand Crus pode proporcianar todo tipo de experimentação, sem que se tenha que se preocupar com seus custos. E um bom exemplo disso no Château Margaux são os testes que vêm sendo conduzidos com tampas de rosca (screw-caps) e rolhas sintéticas. Frequentemente a equipe técnica do Château degusta garrafas que foram fechadas com novos materias para analisar a possibilidade de uma evolução.  A experiância ainda não completou 10 anos, porém, Paul é taxativo: “No momento, a experiência é inconclusiva e assim permanecerá por, pelo menos, 25 anos de análises. Porém, nós não descartamos nenhum tipo de reflexão que possa trazer algum benefício ao vinho do Château Margaux”.

Este ciclo virtuoso do vinho francês teve início com a chegada da safra de 1982 (uma das três maiores do século XX). Naquela época, o mundo começava a experimentar o fenômeno dos mercados financeiros e os novos ricos americanos começaram a acordar para o vinho de Bordeaux. “Nós veremos melhor daqui uns 20 anos, mas eu penso que, quase 30 anos depois, o millésime 1982 é um ‘divisor de águas’, porque foi ao mesmo tempo o primeiro Grande Millésime após 61 (já fazia 20 anos), e ao mesmo tempo o momento em que o mercado internacional se revelava. O millésime 82 foi objeto de um imenso sucesso nos Estados-Unidos. Em toda parte os preços aumentaram e foi a partir deste momento que os jornalistas começaram a vir até aqui. Foi realmente uma mudança, um primeiro Grande Millésime a conhecer um sucesso mundial”.

“Foi um verdadeiro ponto de inflexão, e eu tive a sorte de chegar exatamente na primavera de 1983, ou seja, no momento em que nós apresentávamos o 1982 em degustação”. Quando perguntado se foi o sucesso da safra de 82 que o fez voltar para Bordeaux, Paul responde: “De maneira alguma. Em 1982 eu estava no Chile. Eu voltei em fevereiro de 1983 e, até o mês de maio, ninguém havia provado o 82, ou seja, ninguém sabia o que era este millésime”.

“Eu tive o privilégio (e reconheço isso sem nenhum problema) de chegar exatamente no momento em que a história do vinho passava por uma mudança. É verdade que a partir daquele momento ficou bem mais fácil de trabalhar, e a busca pela excelência pôde ir mais longe. O limite no sonho de excelência ficou mais distante, e não cessou de progredir a partir daquele momento. Quando eu penso na maneira como nós trabalhávamos, e na qualidade que pudemos alcançar em dois millésimes como 2009 e 2010, em comparação ao que tínhamos feito em 89 e 90, ou seja, com 20 anos de diferença, não me parece que estamos no mesmo mundo”.

As melhores Millésimes de Paul PONTALLIER e do Château Margaux

Se todo mundo tem suas preferências quanto aos vinhos e safras, Paul se une aos grandes vignerons do mundo ao comparar seus vinhos a seus filhos. Desta forma, quando perguntado sobre suas preferências ele declarou: “Essa é uma pergunta MUITO difícil; eu diria quase injusta. É como se você me perguntasse qual dos meus filhos eu gosto mais. Porque todos estes millésimes, de alguma maneira, eu ajudei a nascer e os conheço todos muito bem. Para alguns, mesmo os pequenos defeitos me parecem simpáticos”.

“Além disso, após 1982, nós tivemos a sorte de ter ciclos climáticos muito favoráveis e uma série de millésimes EXTRAORDINÁRIOS. Eu diria que este ritmo se acelerou no século XXI, a partir do ano de 2000, três anos em quatro são Grandes millésimes. Quando eu penso em 2000, 2003, 2005, 2009, 2010, digo que são millésimes INCRÍVEIS! Mas eu acho que a gente se sente mais próximo, tem mais emoção e mais afeição pelos Millésimes mais grandiosos. 1990 é um millésime incrível para mim, também 1996, 2000… Enfim, é muito difícil escolher. Sempre me fazem esta pergunta e eu sempre tenho dificuldade em responder, porque sinceramente eu acho que cada um é remarcável por uma razão particular. É como se você me perguntasse dentre os concertos para piano de Mozart (e eu acho que é quase a mesma quantidade, acho que existem 25) qual eu gosto mais. Eu não posso dizer que gosto de todos da mesma forma, mas dos 7 ou 8 que eu adoro, eu seria incapaz de dizer qual deles eu prefiro, porque em cada um há a genialidade que se exprime – que não se exprime da mesma maneira, mas que mostra o gênio por trás da obra”.

“É verdade que por trás de cada Grande millésime existem estórias interessantes. Eu penso, por exemplo, no 1996 (que pra mim é um Margaux perfeito). O ano de 1996 começou longe de ser um Grande Millésime. No momento da vindima eu nem sequer imaginei que ele seria bom. 1990 foi um ano complicado: um verão ruim, um período de maturação das uvas muito longo. Mas nem tudo é sacrifício e alguns millésimes são simplesmente perfeitos: 2009 e 2010 – não imagino que possa existir melhor”.

“Bom, cada ano é um caso particular, e é o que faz o nosso métier tão fantástico. Ele não é repetitivo, monótono. Todo ano tudo recomeça… e, como muitas questões ainda não foram respondidas, todos os anos eu aprendo mais e mais. Eu descubro razões de duvidar do que eu achava já ter entendido, e ainda descobrir outras coisas. E, sinceramente, isso não é uma figura de estilo, a cada ano eu me permito questionar, não sobre TUDO, mas sobre vários pontos os quais eu acreditava já ter compreendido. É verdadeiramente MUITO interessante no aspecto intelectual e também um teste constante de humildade, pois nunca podemos dizer: bom, já entendi tudo, agora vou fazer algo diferente… De maneira alguma!”

Paul PONTALLIER degustando seus vinhos

Passando da abordagem teórica e filosófica de seu vinho, Paul propõe de explicar melhor durante a degustação: “O que faz do Château Margaux único é a preeminência da elegância sobre a potência. Em alguns vinhos de Margaux, esta elegância não vem necessariamente acompanhada de muita potência, porém, nos vinhos do Château Margaux, em função da tipicidade e da qualidade de seu terroir, a potência é tal que o vinho vai envelhecer durante 50, 60, 70 anos, e guardar ainda muito frescor. Este aqui [se referindo ao 2008 em sua taça], em 50 anos, estará soberbo!

Quando perguntado sobre o potencial de seus ‘segundos vinhos’: “Bom, o Pavillon [Rouge  du Château Margaux], uns 30 anos… Sim, claro! Sem nenhum problema”.

“É o refinamento e a elegância que dominam, mas a potência vem logo na sequência. Frequentemente se diz que Château Margaux (e eu acho que é uma boa imagem), é uma mão de ferro em uma luva de veludo. Dito de outra maneira, nós vemos apenas a suavidade, porém, sob esta suavidade há uma força enorme”.

“O segundo ponto é o perfume; Château Margaux é um vinho perfumado, não apenas aromático, mas sim perfumado. A diferença é que o perfume é algo mais envolvente, mais complexo e mais profundo. Eu diria que o perfume, acima de tudo, é mais envolvente (afinal os perfumes femininos são desenvolvidos para seduzir os homens) e o perfume de Margaux tem esta característica de sedução. Na boca, encontramos esta textura tânica que é muito macia, mas ao mesmo tempo muito densa e muito potente. Ao final, você pode sentir a potêcia, que é discreta, pois não tem necessidade de se exprimir, de se exibir”.

É recorrente a curiosidade a respeito dos vinhos feitos a partir das modernas técnicas de enologia; se são melhores que os produzidos no passado. Quando perguntado se as millésimes mais antigas do Château Margaux eram abordáveis na juventude como são hoje, Paul responde: “Não, e por diferentes razões que conhecemos muito bem hoje em dia, porém nas Grandes safras de antigamente era assim. As extraordinárias millésimes sempre tiveram esta característica”.

“Esta maciez na textura se deve em grande parte à maturidade das uvas. Em Bordeaux, até uns 30 anos atrás (até 1982), por razões climáticas e por escolhas técnicas, as uvas eram frequentemente colhidas antes de atingirem este nível de maturidade, que lhes permite adquirir esta maciez”.

“Antigamente os vinhos eram menos suaves por diversas razões: o clima não era muito favorável; não se trabalhava da mesma maneira; guardava-se um nível de acidez no vinho para que ele pudesse se conservar… Hoje em dia, nós compreendemos que não é o nível de acidez que conta, mas ao contrário, é a densidade de taninos. E por isso, os vinhos, em geral, se tornaram mais suaves. Eu bebi vinhos do Château Margaux dos últimos 100 anos, e penso que certas millésimes (as melhores), ainda jovens, eram extremamente delicadas”.

 O Brasil

Paul PONTALLIER tem uma grande adimiração pela cultura que o brasileiro tem do vinho: “O que eu observei no Brasil, nestes últimos 30 anos, é que os brasileiros que tive a oportunidade de encontrar, e que são amantes do vinho, têm uma cultura de vinho EXTREMAMENTE próxima da nossa; e eu devo dizer que fiquei muito bem impressionado. Nós gostamos das mesmas coisas, reagimos da mesma maneira… Acho que por isso eu sou muito otimista com relação ao mercado de grandes vinhos no Brasil”.

“Por um lado há este alicerce de cultura (que é muito propício ao reconhecimento da qualidade de um Grande vinho), e por outro lado, o Brasil começa a enriquecer de maneira notável (e certo número de pessoas enriquecem de uma maneira ainda mais notável!)” [risos].

“Tudo isso colabora para a criação de uma grande base de consumidores. Até alguns anos atrás, havia no Brasil apenas algumas famílias afortunadas que amavam de uma forma extraordinária o vinho. Acho que a paixão permaneceu e o que é novo, é o número de pessoas que agora possuem meios para comprar Grandes vinhos. Este número aumentou bastante”.

“Desta forma, a comunhão desta magnífica cultura do vinho, com os meios, cada vez mais disponíveis para um maior número de pessoas, faz do Brasil um mercado extremamente interessante!”

Château Margaux sem complicação

Paul não se priva de se deleitar ao degustar o Château Margaux e é convicto de que não é necessário ser um expert para aproveitar este vinho incrível, ao contrário: “O vinho é como a música: não é necessário grande conhecimento para se emocionar. As Grandes músicas não exigem esforço, elas dão prazer, emoção. E com os Grandes vinhos deve ser assim: sem complicação, fáceis de beber”.

 

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